No suplemento P2 do Público de 20-04-2025 (p. 2), o psicólogo Luís Fernandes afirma que, segundo Michel Foucault, os detentores do poder são frequentemente grotescos. E refere os exemplos mais recentes: Putin, Netanyahu, Trump, Bolsonaro e Berlusconi. Mas, em minha opinião, o carácter grotesco abrange um conjunto muito mais vasto do que o dos governantes. O homem é um ser intrinsecamente grotesco, uma marioneta conduzida por forças que desconhece e por mitos mais ou menos absurdos, mas sempre presentes, um ser que se diverte rindo dos seus semelhantes e perseguindo-os.
Vários autores têm composto um retrato do “poder grotesco”, em particular Alfred Jarry (na peça teatral “Ubu Rei”, de 1896) e Michel Foucault (no livro “Os anormais”, de 1999). No artigo “Ubu, o fantasma que saiu do armário” (disponível na Internet), Francisco Louçã analisa as ideias destes autores sobre o poder grotesco (ou ubuesco). Neste artigo pode ler-se: “O poder ubuesco não é uma falha, é uma organização; o seu chefe não está no poder apesar de ser desqualificado, está no poder precisamente por isso e usa-o para reforçar o carácter único dessa desqualificação, exibindo-a e banalizando-a”.
No artigo “A Vida Administrada Pelo Grotesco”, de Ridivaldo Procópio da Silva (disponível na Internet), o autor analisa o mesmo assunto no contexto brasileiro, pensando em Bolsonaro. Este artigo termina com o seguinte parágrafo:
“Os aparelhos de poder da modernidade são todos eles grotescos, por isso abrem condições de possibilidades para que sujeitos ridículos ocupem posições influentes e decisivas. São figuras tão grotescas, que mesmo depois de destituídas, permanecem como ameaças, espreitando, podendo voltar ou produzir outros sujeitos ainda mais grotescos. Estejamos atentos.”Se um homem sensato pudesse criar um mundo, este seria muito diferente do mundo em que vivemos. Apenas um exemplo, dos muitos que podem ser dados: o povo cigano e o povo judeu são claramente realizações insensatas. A lógica do Universo é a de maximizar as diferenças entre os seres vivos, diferenças que estão na origem de conflitos quase permanentes.
A incapacidade dos governantes é tal que não têm conseguido pôr em prática conhecimentos decisivos para a sobrevivência da espécie. Quando a Humanidade chegar ao fim, terá havido um enorme desperdício de conhecimento científico. No entanto, a sobrevivência da espécie depende sobretudo da maneira como vivemos e não apenas das nossas capacidades científicas e tecnológicas.
“Nos nossos dias, mais do que a ausência ou a morte de Deus, é proclamado o fim do homem.” (Michel Foucault)“Talvez o objectivo hoje em dia não seja descobrir o que somos, mas sim rejeitar o que somos.” (Idem)
“Enquanto se basear na colaboração de homens de carne e osso, todo o poder, por mais duro que seja, deverá contar com o consentimento destes. Mas quando for baseado em máquinas que mantenham a ordem e a disciplina, não haverá mais nenhum freio. O problema das máquinas não é que elas venham a revoltar-se contra o hommem, é que elas sigam as ordens à letra. […] A máquina terá tornado possível o poder na sua forma absoluta. Um só homem poderá então dominar a humanidade inteira. E será um indivíduo qualquer, sem talento particular, porque o poder já não residirá no homem, mas na máquina, e um homem escolhido ao acaso, poderá fazê-la funcionar.” (Giuliano da Empoli, in “O mago do Kremlin”, pp. 264-266) Numa apresentação deste livro de Giuliano da Empoli pode ler-se:
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