Todos temos limitações mentais e por isso qualquer pessoa pode ocasionalmente agir estupidamente, mas raramente ela estará disposta a admitir que é estúpida. Além disso todos temos tendência para considerar estúpidos os que não conseguimos convencer da falsidade das suas crenças, que muitas vezes resultam de emoções irracionais.
O teólogo Dietrich Bonhoeffer viveu na Alemanha durante o nazismo e foi enforcado pelos nazis pouco antes do suicídio de Hitler. Para ele a verdadeira causa do nazismo era a estupidez humana. No texto “Sobre a Estupidez”, cuja tradução apresento abaixo, ele afirma que a influência das multidões aumenta a probabilidade de uma pessoa se tornar estúpida. Ora, as actuais redes sociais criam multidões virtuais que despertam emoções capazes de explicar crenças estúpidas. A estupidez continua a ser uma grande ameaça para a democracia, por estar na origem dos populismos actuais. Mas, em minha opinião, a democracia é ao mesmo tempo o melhor antídoto contra a estupidez, se permitir uma educação eficaz dos cidadãos através de um diálogo permanente entre as várias correntes políticas. Este diálogo deve ser capaz de desmascarar as propostas políticas erradas e ensinar os cidadãos a identificar o grau de demagogia dos diversos políticos. Todo o político deve ser pedagógico e portanto deve pôr a Razão à frente da emoção.
A estupidez manifesta-se por uma ausência de espírito crítico. Nestas condições, a massa de cidadãos comporta-se como um rebanho que segue as instruções dos caciques mais activos. No Alentejo, se os cidadãos votassem na esquerda convictamente, eles não teriam mudado para o Chega tão facilmente.
Segundo Bonhoeffer, estar inserido numa multidão diminui o espírito crítico de uma pessoa.
“A democracia é um erro estatístico, porque na democracia decide a maioria e a maioria é formada de imbecis.” (Jorge Luis Borges) Imbecil é sinónimo de estúpido.
A reeleição de Trump prova bem a verdade deste pensamento de Borges.
Tradução do texto do vídeo do Youtube “Bonhoeffer‘s Theory of Stupidity”:
A estupidez é um inimigo mais perigoso do bem do que a maldade. Pode-se protestar contra o mal; pode ser exposto e, se necessário, prevenido pelo uso da força. O mal transporta sempre em si o germe da sua própria subversão, na medida em que deixa nos seres humanos pelo menos uma sensação de desconforto.
Contra a estupidez, somos indefesos.
Nem os protestos nem o uso da força resolvem aqui nada; razões caem em ouvidos moucos; factos que contradizem o próprio preconceito simplesmente não precisam de ser acreditados — em tais momentos, a pessoa estúpida chega a tornar-se crítica — e quando os factos são irrefutáveis, são simplesmente descartados como inconsequentes, como incidentais. Em tudo isto, a pessoa estúpida, em contraste com a maliciosa, é totalmente auto-suficiente e, sendo facilmente irritável, torna-se perigosa ao passar ao ataque.
Por essa razão, é preciso ter mais cautela com um estúpido do que com alguém maldoso. Nunca devemos tentar persuadir o estúpido com argumentos, pois isso é insensato e perigoso.
Se queremos saber como ultrapassar a estupidez, devemos procurar compreender a sua natureza. Uma coisa é certa: ela não é, na sua essência, um defeito intelectual, mas humano. Existem seres humanos com um intelecto notavelmente ágil, mas estúpidos, e outros que são intelectualmente bastante obtusos, mas tudo menos estúpidos.
Descobrimos isso, para nossa surpresa, em situações específicas. A impressão que se tem não é tanto a de que a estupidez é um defeito congénito, mas antes a de que, em determinadas circunstâncias, as pessoas se tornam estúpidas ou permitem que isso lhes aconteça.
Observamos ainda que as pessoas que se isolaram, ou que vivem em solidão, manifestam este defeito com menos frequência do que os indivíduos ou grupos de pessoas inclinados ou condenados à sociabilidade. E, por isso, parece que a estupidez é talvez menos um problema psicológico do que sociológico.
É uma forma particular do impacto das circunstâncias históricas nos seres humanos, um concomitante psicológico de certas condições externas. Observando mais atentamente, torna-se evidente que toda a forte ascensão de poder na esfera pública, seja de natureza política ou religiosa, infecta grande parte da humanidade com estupidez.
Parece até que se trata virtualmente de uma lei sociológico-psicológica. O poder de um precisa da estupidez do outro.
O processo aqui em acção não é o de que capacidades humanas específicas, por exemplo, o intelecto, atrofiam ou falham subitamente. Em vez disso, parece que, sob o impacto avassalador do poder crescente, os humanos são privados da sua independência interior e, mais ou menos conscientemente, desistem de estabelecer uma posição autónoma face às circunstâncias emergentes.
O facto de o estúpido ser frequentemente teimoso não nos deve cegar para o facto de que não é independente. Numa conversa com ele, praticamente sentimos que não estamos perante uma pessoa, mas sim perante slogans, palavras de ordem e coisas do género que se apoderaram dele. Está sob um feitiço, cego, maltratado e abusado no seu próprio ser. Tendo-se tornado uma ferramenta irracional, o estúpido será também capaz de qualquer mal e, ao mesmo tempo, incapaz de ver que é mal. É aqui que reside o perigo do mau uso diabólico, pois é este que pode destruir de uma vez por todas os seres humanos.
No entanto, neste preciso ponto, é bastante claro que só um acto de libertação, e não de instrução, pode superar a estupidez.
Aqui, devemos aceitar o facto de que, na maioria dos casos, uma genuína libertação interior só se torna possível quando a libertação exterior a precede. Até lá, devemos abandonar todas as tentativas de convencer a pessoa estúpida.
Este estado de coisas explica por que razão, em tais circunstâncias, as nossas tentativas de saber o que “o povo” realmente pensa são em vão e por que razão, nestas circunstâncias, esta questão é tão irrelevante para a pessoa que pensa e age de forma responsável. A palavra da Bíblia de que o temor a Deus é o princípio da sabedoria declara que a libertação interior do ser humano para viver uma vida responsável diante de Deus é o único caminho genuíno para superar a estupidez.
Mas estas reflexões sobre a estupidez também nos consolam, pois proíbem-nos terminantemente de considerar a maioria das pessoas estúpida em qualquer circunstância. Na verdade, dependerá de aqueles que estão no poder esperarem mais da estupidez das pessoas do que da sua independência e sabedoria interior.
A verdadeira crença em Deus determina uma necessidade permanente de partilhar as boas emoções. Algumas pessoas são crentes por natureza. “Muito do que foi chamado religião carrega uma atitude inconsciente de hostilidade em relação à vida. A verdadeira religião deve ensinar que a vida está cheia de alegrias agradáveis aos olhos de Deus, que o conhecimento sem acção é vazio. Todos os homens devem ver que o ensino da religião por regras e rotina é em grande parte uma farsa. O ensino adequado é reconhecido com facilidade. Pode conhecê-lo sem falhar porque desperta dentro de si aquela sensação que lhe diz que isto é algo que sempre soube.” (Frank Herbert) “Quando a religião e a política viajam na mesma carroça, os condutores acreditam que podem afastar tudo do caminho.” (Frank Herbert) Veja-se o regime teocrático do Irão. Actualmente vemos governantes cometer as piores atrocidades, e ao mesmo tempo a apelar à religiosidade do povo e a invocar Deus com frequência. Estes safados e hipócr...
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